sexta-feira, 9 de agosto de 2013

“I took a deep breath and listened to the old brag of my heart. I am, I am, I am.” Sylvia Plath

Desde que me lembro que tenho uma teoria, que se comprova sistematicamente: os anos ímpares não me correm nada bem. Os anos pares também podem não correr bem, mas os ímpares têm sempre algo de profundamente negativo, que o tornam marcante.
Sei que durante muitos anos, viva-os eu, não me esquecerei do ano de 2013. No último natal senti a necessidade de escrever e guardar para memória futura tudo quanto a minha avó se lembrava dos nossos antepassados, quase como um pressentimento e à semelhança do que já tinha acontecido quando foi a vez do meu avô e num dia de Janeiro a minha avó estava cá e no outro caída na cama, ainda quente, fulminada por um ataque cardíaco.
O choque do momento e o facto de saber que a minha mãe também não tem um coração 5 estrelas, levaram-me a engolir em seco, trancar a dor, emparedar-me com força e dar-lhe o apoio que ela e outros tantos precisavam. Ainda não sei como é que aguentei aqueles 4 dias, até ao funeral mas lembro-me, como se fosse hoje, que um amigo da família que não é muito próximo, sussurrou-me ao ouvido e definiu-me à essência em poucos momentos, enquanto a minha avó descia à terra : "fazes-te de forte, tens um muro à tua volta, mas por dentro és uma folha de papel". Eu sorri, continuei a aguentar e depois dormi por 20 horas. Ainda não consigo entrar na casa da minha avó, passar o portão do cemitério e ainda tenho pesadelos, mas já chorei o que havia por chorar e finalmente começo a recordar-me dela viva e a rir-me daquelas pequenas coisas que só ela tinha e que por vezes me tiravam do sério.

Durante os últimos meses tenho tentado deitar abaixo alguns muros (e outros que já vêm de trás), falar mais com as pessoas, sair de casa, ver gente, beber copos, fazer qualquer coisa além da rotina casa-trabalho-casa que não faz nada mais que lançar betume aos tijolos e tornar-me numa ilha, mas nem sempre é fácil. Acresce a isto o facto de, não tendo obviamente sequer comparação com a morte da minha avó, me vi afundada com grande espalhafato numa onda de auto comiseração, já que vou fazer 30 anos em Setembro e (1) tenho um trabalho que, apesar de ter algumas regalias, me transformam num bicho anti-social e com rastilho fácil e portanto me envelhecem e aumentam a probabilidade de gastrites nervosas (2) quero viajar, conhecer coisas e afins e não tenho capital para isso. Se eu tivesse coragem para isso, já tinha entregado a carta de demissão, largado um trabalho que embora efectivo, não me empolga e andava por aí, onde houvesse trabalho e onde me sentisse feliz e em paz. Mas não a tenho e não posso culpar a crise ou o estado do país, que eu nunca tive medo de trabalhar, nem que fosse na agricultura. A minha avó dizia muitas vezes, quando me cravava para a ajudar a lavar as galinheiras e as coelheiras e eu resmungava que aquilo era só merda, que a água lava tudo e se não lavasse sabão azul e branco e palha de aço, faziam o resto.

Por isso, vou em baby steps e sais de fruta. Até ao fim do ano, espero no entanto ter a genealogia da família adiantada, numa espécie de projeto pessoal, para termos algo com que rir no próximo natal e porque para mim, de quem vimos define muito quem somos. Quem sabe não descubro um parente riquíssimo, que não se importe de patrocinar aquela ribatejana maluca que diz que é família e que tão nova, já está com uma crise de meia idade.

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